
Pesquisa revela que alimentação rica em fibras pode restaurar o microbioma intestinal e melhorar a saúde
Nova fase do estudo internacional será conduzida em Goiânia com pacientes diabéticos
Uma descoberta promissora sobre o impacto da alimentação na saúde intestinal pode transformar a forma como doenças metabólicas são prevenidas e tratadas. Publicado na revista CELL, o estudo foi conduzido por uma equipe de pesquisadores internacionais, incluindo o professor da Faculdade de Nutrição da UFG (FANUT/UFG), João Felipe Mota, o especialista em ecologia do microbioma intestinal, Prof. Jens Walter, e a nutricionista Anissa Armet, que durante o período de desenvolvimento da pesquisa era doutoranda no grupo.
O estudo demonstrou que uma dieta rica em fibras pode restaurar características do microbioma intestinal alteradas pela industrialização, trazendo benefícios diretos para a saúde, como a redução do colesterol, do açúcar no sangue e da inflamação. Atualmente, os pesquisadores se preparam para uma nova etapa da investigação, desta vez no Brasil. A pesquisa, que será realizada em Goiânia, busca avaliar os efeitos dessa intervenção alimentar em pacientes com diabetes tipo 2. O objetivo é comprovar como mudanças na dieta podem melhorar o controle glicêmico e influenciar positivamente a microbiota intestinal, abrindo caminho para novas diretrizes nutricionais e estratégias terapêuticas acessíveis.
- Como surgiu essa pesquisa e qual a sua principal descoberta publicada na revista CELL?
Essa pesquisa nasceu a partir de estudos com populações rurais, especificamente na região de Papua-Nova Guiné. Lá, a alimentação é baseada principalmente em alimentos de origem vegetal, com apenas uma pequena porção de carne branca. Isso faz com que o consumo de fibras alimentares seja muito alto em comparação com dietas ocidentais.
Em 2018, durante meu pós-doutorado na University of Alberta com a Dr. Carla Prado, conheci o Prof. Jens Walter, um especialista em ecologia do microbioma intestinal, e Anissa Armet, que na época era doutoranda no grupo. Juntos, desenvolvemos um estudo clínico muito controlado do ponto de vista nutricional. Os participantes recebiam todas as refeições controladas, mas mantinham suas atividades diárias normais. Nesse estudo, observamos que uma alimentação direcionada à restauração do microbioma intestinal pode melhorar a relação entre o corpo e as bactérias intestinais, ajudando a combater doenças crônicas. Esses achados podem contribuir para novas recomendações nutricionais e o desenvolvimento de estratégias terapêuticas.
- Quais foram os impactos mais significativos do estudo e como ele pode influenciar a saúde pública?
Os resultados foram surpreendentes:
- A dieta restaurou características do microbioma que haviam sido alteradas pela industrialização.
- Melhorou metabólitos no sangue que são produzidos pela microbiota e têm impacto na saúde.
- Promoveu perda de peso.
- Reduziu o colesterol LDL ("ruim") em 17%.
- Diminuiu os níveis de açúcar no sangue em 6%.
- Reduziu a proteína C-reativa (um marcador de inflamação e risco cardiovascular) em
14%.
Além disso, descobrimos que as melhorias na saúde cardiometabólica estavam diretamente relacionadas às mudanças no microbioma intestinal. Isso é extremamente fascinante do ponto de vista da saúde pública, pois promove melhorias significativas na saúde por meio de uma abordagem acessível e saudável, sem efeitos colaterais prejudiciais. Além disso, essa intervenção poderia reduzir consideravelmente os gastos públicos com internações, cirurgias, medicamentos e outros custos médicos.
- A pesquisa contou com colaboração internacional. Como essa parceria foi estabelecida e de que forma ela contribuiu para os resultados do estudo?
Sim, o estudo contou com a participação de pesquisadores de diversas instituições internacionais, cada um contribuindo com sua expertise em diferentes etapas do processo, desde o planejamento e condução do estudo até a interpretação e discussão dos resultados. Essa colaboração foi estabelecida a partir de conexões acadêmicas e científicas que desenvolvi ao longo da minha trajetória, especialmente durante meu pós-doutorado na University of Alberta, onde trabalhei com a Dr. Carla Prado. Foi lá que conheci o Prof. Jens Walter e a doutoranda Anissa Armet. Outros especialistas se juntaram ao projeto, trazendo conhecimento em áreas como nutrição, microbiologia, bioinformática e metabolômica.
- Além do impacto acadêmico, quais são as possíveis aplicações práticas dos resultados para a saúde da população?
Estamos desenvolvendo um livro de receitas e adaptando algumas preparações e o plano alimentar para a realidade da população brasileira. A aplicação dessa abordagem é relativamente simples, mas idealmente deve ser acompanhada por um nutricionista, que pode
ajustá-la às necessidades individuais de cada pessoa. Além disso, estamos iniciando uma nova pesquisa com pacientes com diabetes tipo 2 para avaliar como essa intervenção alimentar pode beneficiar pessoas com condições metabólicas. Se os resultados forem positivos, essa estratégia poderá ser incorporada em diretrizes nutricionais e políticas de saúde pública, ajudando a prevenir e tratar doenças crônicas de forma acessível e sustentável.
- Como será conduzida a nova fase do estudo com pacientes com diabetes tipo 2 em Goiânia, o que pretende-se investigar nessa etapa e quais os critérios para participação?
Nesta nova fase do estudo, estamos adaptando o plano alimentar para os padrões brasileiros, incorporando alimentos regionais, saudáveis e acessíveis. Nosso objetivo é facilitar a adesão à dieta, tornando-a mais viável para a população. Contamos com uma equipe altamente qualificada para conduzir um estudo dessa magnitude, incluindo endocrinologistas, nutricionistas, um gastrônomo, bioinformatas e biomédicos, além da colaboração de renomados pesquisadores internacionais, como os Professores Jens Walter e Carla Prado, e a nutricionista e doutora Anissa Armet. Esse ensaio clínico será realizado com pacientes diagnosticados com diabetes tipo 2 que apresentam controle insuficiente da doença. Para selecionar os participantes, aplicaremos questionários de triagem que nos permitirão avaliar se eles atendem aos critérios do estudo. O objetivo principal é investigar como essa intervenção alimentar pode impactar o controle glicêmico, a microbiota intestinal e outros marcadores metabólicos, contribuindo para o desenvolvimento de estratégias nutricionais mais eficazes no tratamento do diabetes tipo 2. Para isso, estamos pré-cadastrando interessados em participar do estudo, os quais podem enviar e-mail para restoredm.brasil@gmail.com.
Fonte: PRPG UFG